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3.6.06
  A Fotografia de Camilo
Cadeia da Relação - Centro Português de Fotografia, Campo Mártires da Patria, Porto, Portugal, Março de 2005.

Recebi um e-mail essa semana e deixo aqui minha contribuição na maratona fotográfica, numa foto de férias, ruim mesmo, mas daquelas mais bonitas, as descomprimissadas. Porque o que está em jogo não é a fotografia em si... Àqueles que desejarem fazê-lo, por favor, defendam e divulguem.

"São treze dias corridos do mez de Março de 1805.

Está Simão n'um quarto de malta das cadêas da Relação. Um catre de táboas, um colchão de embarque, uma banca e cadeira de pinho, e um pequeno pacote de roupa, collocado no logar do travesseiro, são a sua mobilia. Sobre a mesa tem um caixote de pau preto, que contém as cartas de Thereza, ramilhetes sêccos, os seus manuscriptos do carcere de Vizeu, e um avental de Marianna, o ultimo com que ella enxugára lagrimas, e arrancára de si no primeiro instante de demencia.

Simão relê as cartas de Thereza, abre os envoltorios de papel que encerram as flôres resequidas, contempla o avental de linho, procurando os visiveis vestigios das lagrimas. Depois encosta a face e o peito aos ferros da sua janella, e avista os horisontes boleados pelas serras de Vallongo e Gralheira, e cortados pelas ribas pittorescas de Gaya, do Candal, de Oliveira, e do mosteiro da serra do Pilar. É um dia lindo. Reflectem-se do azul do ceu os mil matizes da primavera. Tem aromas o ar, e a viração, fugitiva dos jardins, derrama no ether as urnas que roubou aos canteiros. Aquella indefinida alegria, que parece reluzir nas legiões de espiritos, que se geram ao sol de Março, rejubila a natureza, que toda pompas de luz e flôres se está namorando do calor que a vai fecundando.

Dia de amor e de esperanças era aquelle que o Senhor mandava á choça encravada na garganta da serra, ao palacio esplendoroso que reverberava ao sol os seus espiraculos, ao opulento que passeava as suas molles equipagens, bafejado pelo respiro acre das çarças, e ao mendigo que desentorpecia os membros encostado ás columnas dos templos."

(Camilo Castello-Branco, Amor de Perdição)
 
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